Curiosidades da língua portuguesa
Curiosidades da língua portuguesa
ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO, INCULTA E BELA"
A expressão "Última flor do Lácio, inculta e bela" é o primeiro verso de um famoso poema de Olavo Bilac, poeta brasileiro que viveu no período de 1865 a 1918. Esse verso é usado para designar o nosso idioma: a última flor é a língua portuguesa, considerada a última das filhas do latim. O termo inculta fica por conta de todos aqueles que a maltratam (falando e escrevendo errado), mas que continua a ser bela.
LÍNGUA PORTUGUESA
Olavo Bilac
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amote assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!"
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
O QUE É UXORICÍDIO?
Não há quem não saiba o que significa essa maldita palavra: o ato de matar outra pessoa; assassinato.
O elemento "cídio", que vem do latim, significa justamente assassínio, assassinato, morte. Uxor, também do latim, significa mulher casada. Assim, uxoricídio é o assassinato da própria mulher. E "uxoricida" nada mais é do que aquele que executa o maldito ato. O elemento "cida", também de origem latina, indica aquele que mata. É o mesmo de inseticida, vermicida, fungicida.
Já a mulher que mata o próprio marido chama-se mariticida, e o ato que ela comete denomina-se mariticídio. Identifica-se aí novamente o elemento "cídio", o mesmo de palavras como genocídio, homicídio, filicídio, infanticídio.
O QUE É FACTÓIDE?
Millôr Fernandes
Continuo lendo e utilizando o Houaiss (já imprescindível, como o Aurélio é desde o século passado). E pescando. Algumas vezes o peixe não está lá. Por exemplo, Factóide . O Houaiss não traz esse substantivo, já incorporado pelo Aurélio :
Factóide - Substantivo. Brasileirismo. Gíria .
" Fato, verdadeiro ou não, divulgado com sensacionalismo, no propósito deliberado de gerar impacto diante da opinião pública e influenciá-la ."
Peraí, com a omissão da palavra num dicionário e outro dizendo que a palavra é brasileira e gíria, a moçada vai continuar acreditando que factóide é uma invenção de Cesar Maia, como ele próprio acredita e apregoa.
A palavra factóide vem do inglês, incorporada ao léxico americano pelo t.r.h.d.o.t.i.l. desde 1983. Segundo o t.r.h.d.o.t.i.l. , factóide é " algo fictício ou não provado, mas apresentado como fato, para efeito de propaganda, e incorporado por insistente repetição".
ALGUMAS FRASES INCORRETAS DO NOSSO DIA-A-DIA
Segundo a lei, "estupro" é só de mulheres. Algo parecido ocorre com a palavra "rapto". Com alguma freqüência, temos o desprazer de ler em nossos jornais que "uma criança foi raptada". Novamente, encontramos o mau uso de uma palavra: um menino não pode ser raptado, pois rapto é sempre de mulheres e com fins libidinosos. Na verdade, as crianças são seqüestradas. Como não há pedido de resgate, preferem dizer que elas foram "raptadas". Há quem pense que, se não houver pedido de resgate, não há seqüestro.
Outro engano. Quando o seqüestrador entra em contato com a família e exige alguma coisa em troca para libertar o seqüestrado, temos um outro crime: a extorsão. Assim sendo, o que os jornais chamam de "seqüestro" na maioria das vezes trata-se de um seqüestro seguido de extorsão ou extorsão mediante seqüestro. Seqüestrar é "tirar a liberdade de alguém ou alguma coisa". É por isso que um bem pode ser seqüestrado, ou seja, torna-se indisponível (seu dono não pode vendê-lo, por exemplo).
É interessante lembrar o velho caso do "roubo" e do "furto". Só há roubo se houver algum tipo de "violência". É comum as pessoas definirem os cleptomaníacos como "aqueles que têm a mania de roubar". Está errado. O cleptomaníaco tem a mania de furtar. Em geral, ele não agride ninguém. O seu prazer é "pegar escondido".
É também comum lermos ou ouvirmos no meio jornalístico: "Fulano entrou com uma liminar." Ora, ninguém entra com liminar. Liminar é algo que se pede, e o juiz concede ou não. É a mesma história do "entrar com efeito suspensivo". Isso é muito comum no meio esportivo. "Efeito" é conseqüência. Ninguém "entra" com efeito suspensivo. Mais uma vez é algo que se pede. O certo, portanto, é dizer que "se pediu efeito suspensivo".
Agora, se você quer ver um juiz ficar "louco da vida", é só dizer que ele "deu um parecer". Quem dá parecer é consultor, perito, advogado... Juiz decide.
E em relação ao termo "denúncia", para quem não sabe, a verdadeira denúncia só pode ser feita pelo Ministério Público. Apenas o promotor pode apresentar uma denúncia. Rigorosamente, você não pode denunciar o seu vizinho porque ele bate na mulher. O cidadão comum acusa. Na verdade, nós estamos falando de uma denúncia formal, pois na linguagem popular o uso do verbo denunciar já está consagrado. Depois do "disque-denúncia", então, não tem mais jeito.
O GÊNERO DE AVESTRUZ E SÁBIÁ
Avestruz é palavra masculina ou feminina? Tanto faz. Os dicionários ensinam que se pode dizer "o avestruz" ou "a avestruz". É óbvio que no plural vale o mesmo raciocínio: os avestruzes, as avestruzes. Outra que admite os dois gêneros é sabiá: "Foi lá e é ainda lá que eu hei de ouvir cantar uma sabiá'; "Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá".
CÓLERA: PALAVRA FEMININA OU MASCULINA?
O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da ABL e o novo Dicionário do Aurélio registram-na como substantivo feminino e masculino. Mas o Dicionário Contemporâneo da Língua Portuguesa de Caldas Aulete refere-se à cólera como feminina. O saudoso Antônio Houaiss, em seu dicionário, admite que cólera seja masculina, somente em relação à doença.
PALAVRAS QUE ASSUMIRAM OUTROS SIGNIFICADOS ATRAVÉS DO
TEMPO
Procurando num bom dicionário o significado da palavra "formidável", o primeiro significado que se encontra é "pavoroso, diabólico, horrendo, assustador". E não faltam exemplos clássicos. Mas essa palavra passou a significar algo como "maravilhoso, excelente, fantástico".
Outra desse tipo é "bárbaro". Os gregos e os romanos denominavam bárbaros todos os estrangeiros. Bárbaro também é um indivíduo dos bárbaros, povo do Norte da Europa, que, por sinal, invadiu parte do Império Romano. A palavra também assumiu o significado de "rude, sem civilização, inculto, selvagem". No Brasil, essa palavra possui ainda o sentido de "muito bom, excelente". Muita gente de mais de 40 anos continua usando essa palavra com esse sentido muito comum na época da Jovem Guarda.
Uma surpreendente é "sofisticado". Usada largamente com o sentido de "chique, muito chique, de extremo bom gosto, de alto nível", essa palavra aparece nos dicionários como derivada de "sofisticar", sinônimo de "sofismar", ou seja, "falsificar, adulterar, deturpar". E um sofisma nada mais é do que "argumento falso formulado de propósito para induzir alguém a erro".
Vejam também "relevar": "Relevar um fato" pode ser "destacá-lo", dar-lhe importância, salientá-lo, ou "deixá-lo de lado, ignorá-lo, atenuar sua importância". A palavra simplesmente tem sentidos quase opostos. E mais um que quase passa despercebido: "tornar a levar, levar de novo".
E "percalço" que significa "problema, obstáculo, dificuldade", como é mais usada hoje. Mas também pode significar "lucro, vantagem, provento, rendimento, proveito".
Outro exemplo primoroso é "sanção". Essa palavra pode significar "aprovação" (a sanção que o presidente dá a uma lei, por exemplo). Mas também pode significar "castigo, punição" (as sanções impostas aos que desrespeitam o código de trânsito, por exemplo).
EXPRESSÕES FAMOSAS TÊM ORIGEM NA COLÔNIA E NO IMPÉRIO
Costuma-se dizer que um dos problemas do Brasil é que tem político "à beça" que é "santo do pau oco" e faz leis “para inglês ver“. E, na hora em que a "vaca vai pro brejo", ele é partidário do lema "farinha pouca, meu pirão primeiro". Esse tipo de político não se preocupa com os cidadãos "sem eira nem beira". Mas, a cada quatro anos, chega a "hora de a onça beber água" e muitos não são reeleitos.
As expressões entre aspas têm sido usadas ao longo dos séculos pelos brasileiros e, segundo os historiadores Carlos Eduardo Barata, Francisco Alencar e José Flávio Barroso, demonstram a força da nossa cultura. "Hoje em dia, a maioria pode não saber a origem do termo, mas sabe seu significado. Isso se chama memória coletiva", explica José Flávio. Para Carlos Barat, a preservação dos termos passa de geração a geração dentro do próprio ambiente familiar. "A gente redescobre o Brasil através dessas expressões, que ajudam a preservar nossa identidade", acrescenta Francisco Alencar. Eles explicaram o significado desses termos:
"à beça" - No Rio imperial, havia um comerciante rico chamado Abessa, que adorava ostentar roupas de luxo. Quando alguém aparecia fazendo o mesmo, dizia-se que ele estava se vestindo à Abessa, ou seja, como o comerciante. Virou sinônimo de abundância, exagero.
[Outra versão: a origem dessa expressão, que significa "em grande quantidade", é atribuída à grande profusão de argumentos utilizados pelo jurista sergipano Gumersindo Bessa (1849-1923) ao enfrentar Rui Barbosa em famosa disputa pela independência do território do Acre, que seria incorporado ao Amazonas. Quem primeiro utilizou a expressão foi Rodrigues Alves (1848-1919), presidente do Brasil de 1902 a 1906, admirado da eloqüência de um cidadão ao expor suas idéias:
"O senhor tem argumentos à bessa." Com o tempo, o sobrenome famoso perdeu a inicial maiúscula e os dois esses foram substituídos pela letra c com cedilha (ç).]
"santo do pau oco" - A Coroa Portuguesa costumava cobrar imposto altíssimo sobre as pedras preciosas e o ouro. Quem não queria pagar colocava as peças dentro de imagens de santos e assim passava pelas vistorias que havia nas estradas.
"para inglês ver" - Em 1830, pressionado pela Inglaterra, o Brasil começou a aprovar leis contra o tráfico de escravos. Mas todos sabiam que elas não seriam cumpridas. Falava-se, então, que as leis eram apenas para inglês ver.
"a vaca foi para o brejo" - Quando a seca é mais violenta, os animais começam a procurar os brejos, regiões que permanecem alagadas por mais tempo. É sinal de que a situação piorou.
"farinha pouca, meu pirão primeiro" - A farinha de mandioca era um dos alimentos que os bandeirantes costumavam levar durante suas viagens pelo interior do Brasil. Quando o estoque de comida estava acabando, o prato principal era peixe com pirão. Nesse momento, o chefe da expedição usava a força do cargo.
"sem eira nem beira" - As casas portuguesas de classe média tinham uma pequena marquise para proteção contra a chuva (eira). As mais ricas, além de eira, tinham beira (desenhos arquitetônicos sobre as eiras). Não ter nenhuma das duas era sinal de pobreza.
"hora de a onça beber água" - o animal costuma fazer isso ao anoitecer, e, segundo a tradição indígena, esse é o melhor momento para abatê-lo.
OUTRA EXPRESSÃO CURIOSA:
"É A OVELHA NEGRA DA FAMÍLIA" - a história dessa frase nasceu do milenar trabalho de pastoreio. Em todo o rebanho há um animal de trato difícil, que não acompanha os outros. Cuidando das ovelhas, protegendo-as dos lobos, providenciando-lhes os melhores pastos, o pastor não evita, porém, que uma delas se desgarre. É a "ovelha negra". Por metáfora, a frase passou a ser aplicada nas famílias e em outras comunidades, a filhos ou a afiliados que não têm bom comportamento. Na "Ilíada", de Homero (século IX a. C.) relata o sacrifício de uma ovelha negra como garantia do pacto celebrado entre Páris e Menelau, que resultou na guerra de Tróia. Mas ela não foi punida por mau comportamento. Como muitas ovelhas negras, era inocente.
FUTEBOL: UM ESPORTE BRETÃO?
Amantes e não amantes do futebol já devem ter ouvido locutores e comentaristas de rádio e TV chamarem este jogo, considerado a "paixão nacional dos brasileiros", de "esporte bretão". Mas qual seria a origem desta expressão? Existem muitas controvérsias: a tese mais aceita quanto à origem do futebol é a de que o esporte foi criado pelos ingleses. A Inglaterra faz parte da Grã-Bretanha, o que nos faz supor que o esporte é bretão justamente porque é da Grã-Bretanha. Mas o adjetivo relativo à Grã-Bretanha não é britânico?
No dicionário Aurélio, encontra-se no verbete "bretão": "1. De, ou pertencente ou relativo à Bretanha (França). 2. O natural ou habitante da Bretanha. 3. O idioma desta província francesa." O dicionário também diz que o feminino é "bretã".
E agora? Se o esporte é da Grã-Bretanha, como pode ser bretão, se bretão é da Bretanha, região da França? Que confusão! É por isso que em qualquer caso é sempre bom consultar mais de um especialista. O velho dicionário de Caldas Aulete informa que bretão, além de ser tudo o que diz o Aurélio, também é equivalente a britânico, ou seja, relativo à Grã-Bretanha.
Para outras curiosidades , acesse: https://intervox.nce.ufrj.br/~edpaes/curiosa.htm